domingo, 8 de maio de 2011

Flores de ferro




O ferrageiro de Carmona

Um ferrageiro de Carmona
que me informava de um balcão:
"Aquilo? É ferro fundido,
foi a fôrma que fez, não a mão.

Só trabalho com ferro forjado
que é quando se trabalha ferro;
então, corpo a corpo com ele,
domo-o, dobro-o, até o onde quero.

O ferro fundido é sem luta,
é só derramá-lo na fôrma.
Não há nele a queda-de-braço
e o cara-a-cara de uma forja.

Existe grande diferença
do ferro forjado ao fundido;
é uma distância tão enorme
que não pode medir-se a gritos.

Conhece a Giralda em Sevilha?
De certo subiu lá em cima.
Reparou nas flores de ferro
dos quatro jarros das esquinas?

Pois aquilo é ferro forjado.
Flores criadas em outra língua.
Nada têm das flores de fôrma
moldadas pelas das campinas. 

Dou-lhe aqui humilde receita,
Ao senhor que dizem ser poeta:
O ferro não deve fundir-se
nem deve a voz ter diarréia.

Forjar: domar o ferro à força,
Não até uma flor já sabida,
Mas ao que pode até ser flor
Se flor parece a quem o diga.

(João Cabral de Melo Neto)

Flores de ferro

Quis, Cabral, meu poeta,
Apresentar-me um tal sujeito,
"O ferrageiro de Carmona".
Retruquei, não tenho forma;
Forjar, “nonsense”, atrevo-me:
Domar palavras, enviesá-las
Tem sido desassossego.
As flores que eu enredo
Não bancam sequer o enterro,
Mas perfumam o meu nariz.

(Lou Vilela)
.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Uma ciranda: "Descortinar"


Há algum tempo, participei de cirandas no RL, uma delas com o mote "Descortinar"  proposto por Maria da Glória Perez.  É uma gostosa brincadeira, além de uma oportunidade de aprendizagem.  Enfim, trouxe  o mote para a construção de mais uma ciranda. Caso queira participar, é só deixar o seu texto no campo de comentário. O texto será transcrito para a página inicial do post com indicação de autoria e com um link para o blog do autor - uma forma de interação e divulgação de autores e de seus respectivos trabalhos. Convide mais cirandantes! ;)

A ciranda poética tradicional é composta em trovas, mas aqui serão permitidas outras variações (haicai, poetrix,  rondel, etc.).

Mais algumas considerações sobre ciranda: aqui.

Um abraço a todos!



Clique na imagem para ampliar.
Texto e imagem: Lou Vilela
 



Descortinar

Após abrir a cortina,
Participar do espetáculo...
Ser artista, a minha sina;
A vida, um grande palco.
(Lou Vilela)

"fresta na janela
festa nos olhos"
(Assis Freitas, "mil e um poemas")

"queria não ter esses olhos e nem essa pele
e nem essa alma perdida que se comove com o mundo"
(Adriana Godoy, "Voz")

"Janela,
Porta da alma profana,
Olhos dela,
Seus cílios, persiana."
(Eder Asa, "Lura da Quimera") 

"Abrir janelas no meio da tarde
Deixar o sol entrar
E desenhar asas com lápis de cera
para o infinito alcançar."
(Lu Guedes, "Menina no Sotão")

.